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Não uso mais manequim 42

“Não quero mais olhar pra dentro do meu armário”. “Vou doar minhas roupas”. “De agora, em diante, só quero calça preta de malha com cós alto e blusa longa, também, de malha. Brrrr, é um saco engordar”.

Assim, acordei um dia desses. Assim, decidi não pensar mais em mim. Assim, não quis encarar mais um dos efeitos drásticos da menopausa. Sei que não é para todas. Mas, é para muitas. A gente engorda, sim, depois que os hormônios nos abandonam.

Muito chato! Balela quem diz que é só impressão, coisa de mulher deprimida. Por mais reeducação alimentar e exercícios físicos que faço, o peso só aumenta. Ainda mais, nesses últimos meses quando tivemos que conviver com a parada obrigatória da pandemia: menos atividade física, mais quilinhos. Enfim, decidi também esquecer que balança existe. Tirei da minha vida.

Já estou nessa fase há mais de 20 anos. Entrei na menopausa precocemente por causa de um tumor no ovário esquerdo. Já contei sobre isso no link anterior. Desde então, ralo pra caramba para manter a saúde, a tranquilidade, o sono e o peso, claro. Vou observando a forma do meu corpo que muda.

Mas, de repente, minha paciência se esgota. Parece que as roupas diminuíram. Parece que estão menores do que eu gostaria que fossem. Minha mente fica dando voltas pra justiçar o injustificável. Fico pensando que pode ser a modelagem: “poxa, só fazem roupa para gente pequena, jovem?” Pode ser a lavagem: “ Huuumm, acho que usei o sabão errado e a calça me diz : “amiga, você me encolheu!”

Tudo mentira que a minha mente cria pra se defender. Tem sabão adequado para qualquer tipo de peça. É só ler as informações corretamente para a lavagem. Em pleno 2021, a gente pode dizer que a moda nunca foi tão democrática. É mais plural. Não massacra mais ninguém com tendências ou com o estilo certo ou errado. Tem pra tudo quanto é tipo de gosto, perfil, bolso e idade.

Durante anos trabalhei com figurino, moda, ora como produtora/stylist, ora como redatora ou responsável por eventos do setor. Tenho lembrado muito das aulas com Madame Marie Rucki do Studio Berçot, diretora de uma das escolas de estilo mais renomadas do mundo com sede em Paris.

Vire e mexe, ela vinha a São Paulo. Amava o Brasil, as cores, as sandálias havaianas, a rua 25 de Março no centro da capital paulista. Lembro que ela brigava comigo quando eu queria levar para o papel traços e volumes de peças que não estavam bem organizadas dentro da minha cabeça.

Madame sabia que eu não era uma boa desenhista. Só me virava. Sabia que esse não era meu caminho. De fato, eu não tinha intenção de me tornar uma estilista. Queria, sim, aprimorar o trabalho jornalístico com moda, além de melhorar o desempenho como figurinista. Ela me incentivou desde sempre a procurar dentro de mim aquilo que poderia se transformar em uma ideia, não em mais uma peça de roupa propriamente dita. Me dizia que sempre há algo de positivo e mágico dentro da gente. É só trabalhar mentalmente. Parecia simples, mas não era.

Sim, no meio desses quilos a mais, dessa falta de hormônios, de momentos de desespero total, procuro encontrar o que há de forte e poderoso dentro de mim. Arrumo meu armário. Dou muitas peças que não quero mais usar, que não cabem mais em mim. Fico super feliz quando alguém me manda uma foto “vestida de Guiga”. Bingo! Sempre serve em alguém.

Penso em outro jeito de me vestir, mesmo que seja com uma calça e blusa em malha pretas. Não posso achar que isso é um problema. Não posso mesmo. O que está dentro de mim é maior, mais forte do que esses quilos a mais que a menopausa e a idade me deram. Vá lá, não é um bom presente, mas não tem jeito.