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Maracanã em nome do pai: obrigada

Torço pelo Flamengo. Já sofri muito dentro do Maracanã. Já fiquei quase sem a unha do dedo mindinho da mão direita. Já tive dor de barriga: precisei ir ao banheiro no meio da partida. Já tive muita dor de estômago. Vibrei com as vitórias. Chorei com as derrotas. Me aborreci com as injustiças que só torcedor apaixonado acha que é injustiça.

Fui construindo esse amor desde muito pequena. Aos quatro anos, fiz minha estreia no Maracanã. Esse programa de domingo não era comum para uma menina. Mas, meu pai gostava muito de futebol, torcia para o América, e um dos irmãos dele para o Flamengo.

Os dois me levavam ao estádio. Me ajudavam a subir as arquibancadas de concreto: eram altas demais para uma criança. E, assim, de jogo em jogo, meu amor pelo Flamengo e pelo Maracanã foi aumentando. Quando meu irmão cresceu – na época da minha estreia ele ainda era bebê – passou a nos acompanhar. Claro, também é flamenguista.

De vitória em vitória, de derrota em derrota, fui cada vez mais entendendo como o Flamengo e aquele local faziam, e fazem, parte da minha vida. Fui a muitos shows, produzi ensaios de fotos, participei de vários trabalhos de produção dentro estádio. Em 2017, também, estava lá nos Jogos Pan-americanos.

Em 2014, fiz parte do time do Comitê Organizador Local da Copa do Mundo de Futebol. Nossa base era o Maracanã. Fui responsável pela área de Protocolo que produzia todo o atendimento dos convidados Vips e super Vips da sede Rio de Janeiro.

Foi interessante perceber a alegria do meu pai quando soube que eu estaria na equipe que organizava a segunda Copa do Mundo no Brasil e, especialmente, no Maracanã. Vibrou.

Trabalhei muito, dormi pouco, mas sempre sentia aquela satisfação que só poderia ser minha: estar num lugar que fazia parte da minha existência.

No domingo da final entre Argentina e Alemanha, algumas horas antes de começar a partida, meu pai me ligou. Eu estava bem enrolada. Rádio de comunicação apitando; o segundo celular vibrando no bolso do meu blazer; agente de segurança pedindo orientação; delegado da Polícia Federal querendo checar novamente as rotas de fuga; equipe de limpeza perguntando se usava mais ou menos água sanitária nos banheiros. Ele me desejou sorte e disse que iria torcer pela Alemanha, apesar do 7 x 1: “Melhor time, minha filha”. Agradeci rapidamente: “Beijos, pai. Nos falamos à noite”.

Com o jogo começado, enfim, sabia que teria alguns minutinhos de paz em meio àquela expectativa da final. Caminhei até um corredor, escondida, chorei muito. Não acreditava que estava naquele estádio, que mesmo transformado, havia presenciado a minha vida de torcedora, de amante de futebol e de profissional de eventos e de comunicação.

A emoção tomou conta de mim. Fui acordada pela vibração do rádio: alguém do serviço de alimentação perguntava se eu queria comer algo antes do fim do primeiro tempo.

Meu pai faleceu 2 meses depois, em setembro de 2014, aos 93 anos. Acho que não tive tempo de agradecer tudo o que fez para me levar ao Maracanã por tantas vezes, debaixo de sol, de chuva.

Os muitos anos de idas ao estádio me levaram a ter intimidade com ele, o que facilitou a minha operação durante aquele evento e depois nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016.

Alegria, realização, gratidão. “Obrigada, pai!”