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Mais uma guerra

“A noite era fria, muito gelada. Tinha neve nos telhados. A gente estava escondida numa casa abandonada esperando uma ordem. Meu colega acabou ficando sem um dedo do pé. Eu tinha medo de perder a orelha. Puxei com força a touca de lã debaixo do capacete”.

Meu irmão e eu lembramos até hoje de histórias como essas que meu pai contava. Éramos bem pequenos. Ele esteve no grupo de brasileiros que lutou na Itália durante a Segunda Guerra Mundial. Viajou em 1944 em um dos batalhões que cruzaram o oceano Atlântico rumo ao porto de Nápoles. De lá, rodou o país debaixo de ataques das tropas nazistas tentando se entender com os americanos, enfrentando um inverno pesado e, claro, procurando voltar vivo ao Brasil. Voltou e sem nenhum ferimento.

A guerra e seus horrores, no entanto, ficaram dentro da sua mente e na sua forma de enxergar a vida. Era paciente até demais, não tinha nenhuma vontade de entrar em conflito. Desconfiava dos desconhecidos. Aprendi a andar no meio da rua, longe dos muros. Dizia que nunca se sabe quem poderia estar à espreita.

No último dia 7 de outubro – ele faria 103 anos se estivesse vivo – mais uma guerra estourou no mundo. As histórias voltaram à minha cabeça. Nem sei se todas elas eram reais. Ou se faziam parte da sua capacidade imaginativa de entender as atrocidades dos campos de batalha. E, na sequência, descrever suas experiências de um jeito que a gente pudesse ouvir.

De tudo o que ouvi o que ficou foi a profunda e inexplicável dor que uma guerra traz para todos os lados. Tudo é muito triste. Lembrei da sua luta para sobreviver, do sofrimento da minha avó e de todas as pessoas que passaram, e passam, por esse tipo de situação angustiante e aterrorizante.

Esse conflito deflagrado por um atentado terrorista por terra e por ar deixa a situação ainda mais devastadora. Choro por dentro. Desolador.

Fico pensando na esperança que meu pai tinha de que um dia o mundo vivesse sem uma guerra. Não foi dessa vez.