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Um cavalo e o táxi

Não preciso dizer mais e mais o quanto essa tragédia no Rio Grande do Sul vem me impactando. Por mais que o tempo passe, por mais que eu escreva, penso continuamente no sofrimento e na desesperança que, por hora, paira sobre os gaúchos.

São vidas que deverão emergir desse porto nem tão alegre assim. São histórias que ficaram para atrás e que precisam ser reconstruídas sabe-se lá como e quando.

O desafio é gigantesco para todos os lados que olhamos. Cidades que deverão mudar de lugar; pessoas que precisarão arrumar outros empregos; governos que necessitarão trocar completamente suas visões de mundo, principalmente, sobre o clima e a proteção de seus habitantes. Seres humanos e animais que se foram.

Sou daquelas que curte conversar com motoristas de táxi. Não cito os de aplicativos. O Uber me bloqueou há mais de 3 anos. Até hoje não consegui sair da lista negra. Como não tenho carro, quando não posso usar metrô, ônibus ou andar a pé, vou de táxi.

Semana passada, lá estava eu de papo sobre trânsito, preço do gás combustível, da atualização do taxímetro e das irregularidade do asfalto. O motorista ouvia a CBN. De repente, entrou uma notícia sobre as enchentes e chuvas no Rio Grande do Sul. Ouvimos em silêncio.

Logo depois, comentei sobre a aflição que vivi sobre o cavalo mais famoso do país. Caramelo ficou quatro dias sobre um telhado à espera de resgate. O motorista fez um “hum” e lamentou que o socorro ainda não houvesse chegado.

Disse que enfim o animal havia sido salvo em uma operação dos bombeiros digna de filme, que foi preciso anestesiá-lo, transportá-lo em um bote até um local seguro e seco. No momento, estava aos cuidados de uma equipe de veterinários. Magro, faminto, estava bem e se recuperando.

Falei tanto que não percebi que o motorista havia caído em lágrimas. Me assustei com a cena. Pedi para ele encostar o carro se quisesse. Emocionado, disse que seguiria viagem.

 — Sou da roça no Piauí. Aquele cavalo sozinho me lembrou quando era pequeno.  Ajudava meu pai com os bichos, cabra, cavalo, galinhas. Minha mãe morreu. Ele arrumou outra mulher. Saí de casa porque a madrasta me odiava. Só tinha os bichos.

Achei melhor calar a boca. Só me restava mais uma frase.

— Senhor, me desculpe. Não queria fazer o senhor sofrer. Desculpe do fundo do coração.